quarta-feira, junho 15, 2005

Quadro quotidiano

As camisas impecavelmente engomadas, com um discreto padrão de riscas ou quadrados, sobre as quais se exibem fulgurantes as respectivas gravatas com as cores da moda distribuídas em generosas listas diagonais, tudo concertado por fatos de fina talha, a completar a figura de verdadeiro jovem empresário de sucesso (mesmo que não seja empresário, de sucesso é de certeza, a julgar pelo aspecto), eles são três e estão à espera do elevador.
Na cabeça, os inevitáveis óculos de sol, a postos para o momento de encarar o mundo exterior em mais uma hora de almoço soalheira. Com as mãos direitas, seguram os seus dispositivos móveis, dois smartphones e um PDA (será que os smartphones vão mesmo levar a melhor aos PDA's?), que observam com interesse, como se procurassem ali a resposta para as grandes questões da humanidade, os respectivos auriculares bluetooth cinzento-metalizados nas correspondentes orelhas esquerdas.
Chega o elevador. Inicia-se o ritual cerimonioso de ceder passagem ao outro, num "after you" elevado ao expoente máximo do absurdo: todos levantam os olhos dos minúsculos ecrãs e encaram-se mutuamente. "Faça favor!" "Não, não, força!" O outro opta por não dizer nada mas tenta empurrar o que está à sua esquerda - com a única mão que tem livre - para dentro do elevador. Acaba por não entrar ninguém porque o elevador, que tem mais que fazer, vai-se embora. Todos voltam aos seus telemóveis esquisitos para mais uma sessão de ginástica polegar enquanto esperam pelo próximo.

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